os quatro elementos da natureza os quatro pilares da sabedoria os quatro atributos do corpo os quatro cavaleiros do apocalipse

4.7.06

A 1ª escolha - parte II. Onde o autor discorre, com alguma dose de pedantismo, sobre livros.

Por outro lado e em nítido contraste com os cd's, confesso que não sou capaz de nomear o 1º livro que comprei sozinho, mas não tenho nenhuma dificuldade em lembrar os últimos. Desde que com 7 ou 8 anos descobri a felicidade agarrado como um viciado aos Cinco da Enid Blyton, o livro nunca deixou de ser para mim um objecto de culto. E não falo só dos conteúdos, das histórias mais ou menos interessantes ou mesmo das diferentes formas de escrever de cada autor. Falo de uma atracção física pelo objecto em si, pelas suas formas, pelas suas texturas. Gosto da sensação táctil do virar das páginas, gosto do cheiro que delas emana. Gosto da solidão e daquela paz tranquila que só consigo atingir quando estou a ler. Gosto de dar largas à imaginação, de abandonar nem que seja por breves instantes o local em que estou e o corpo que a minha alma habita para pairar livremente sobre outros locais e sobre outros corpos. Admito que possa soar elitista e a armar ao pingarelho, mas a verdade é que poderíamos perfeitamente generalizar um conhecido dito filosófico e propor algo do estilo diz-me que livros leste e dir-te-ei quem és.
Já fiz há tempos, noutro espaço e com o meu alter-ego real, um top 5 de cd’s e de filmes, mas acabei por nunca conseguir organizar, dessa forma necessariamente simplista e redutora, o meu gosto pelos livros. É que tal como para as pessoas que connosco se cruzam na vida, também para determinados livros há um tempo certo, uma altura ideal para com eles entrar em contacto. Não sei dizer se neste momento teria algum prazer em ler por exemplo Os Capitães da Areia, de Jorge Amado, mas sei que quando tinha 13 ou 14 anos o devorei completamente naquilo que foram 2 longas noites, com lágrimas constantes e algo salgadas a caírem dos olhos para os cantos da boca, e com o meu irmão a dormir tranquilo na cama ao lado e a cidade e os seus poucos habitantes nocturnos de então, as putas, os clientes e os taxistas, do lado de fora. Lembro-me do gozo que me deu descobrir Eça de Queirós e os seus Maias, Carlos e Eduarda, o seu Padre Amaro e aquele seu fabuloso Raposão com a inenarrável relíquia para a titi. Nunca me esquecerei do frenesim quase infantil em que vivi mergulhado durante a leitura do Senhor dos Anéis ou da emoção contente que tirei do Velho que lia Romances de Amor e do seu fantástico episódio do dentista itinerante e do tipo que tirou todos os seus dentes sem anestesia por causa duma aposta com os amigos. Lembro-me também da descoberta de Mário Vargas Llosa na sua Festa do Chibo e do fabuloso Pantaleão com as suas visitadoras, o melhor chulo jamais contado. Não quero também deixar de mencionar, apesar do post já ir longo, quiçá até demasiado, Paul Auster, outro dos meus habituais escritores de mesinha de cabeceira e já agora Umberto Eco com quem aprendi o verdadeiro significado de Dominicanos.
Numa altura em que qualquer roto escreve um livro (não sei se é real mas parece-me que tudo começou quando a Caras Lindas, esse génio da literatura, lançou o Sandálias de Prata...) mas em que paradoxalmente as novas gerações cada vez lêem menos (não, os jornais desportivos e os sms's com língua de trapos não contam) eu, que de anos só conto 30, vejo-me compelido a fazer ainda e sempre esta figura de velho do restelo.

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