os quatro elementos da natureza os quatro pilares da sabedoria os quatro atributos do corpo os quatro cavaleiros do apocalipse

30.1.06

Carta a um amigo


Caro JB

Deixa-me primeiro respirar fundo antes de te responder...

Para melhor compreensão, vou tentar esquematizar as minhas ideias seguindo a ordem paragráfica do teu post...

Ponto 1- "fiquei surpreendido com a forma vulgar como abordaste o tópico"...bom, começo por chamar a tua atenção para os conceitos de ironia e cinismo que me parecem ser de tal forma óbvios no meu post original que achei desnecessário mencioná-lo num eventual post scriptum. Pelos vistos, enganei-me.

Ponto 2- "brincadeira algo confusa e de gosto duvidoso..."
Não sou partidário da tese de que há temas com os quais não se deve glosar. Em relação ao gosto e à confusão do post, só me apraz dizer-te que quem escreve (quer seja uma nota para afixar no frigorífico ou uma crónica opinativa para por num blog) está naturalmente sujeito à apreciação de quem lê. A escrita é tão subjectiva como a sua interpretação. Nada mais natural...

Ponto 3- "Fiquei sem perceber se és realmente a favor do casamento entre pessoas do mesmo sexo ou não"...
Tal como disse num dos trechos "sérios" do post original, sou 100% a favor. Ponto. Olho para o casamento como contrato/opção de vida, um acto voluntário entre duas pessoas maiores de idade. Assim sendo não cabe nem ao estado nem a qualquer credo religioso interferir.
Quando dizes "O argumento de que o casamento entre pessoas do mesmo sexo deve ser um direito válido apenas para as mulheres é sem dúvida inovador... mas escapou-me o seu racional... Também não percebi de que forma as imagens que colocaste ajudam na discussão...",
sinceramente custa-me a acreditar que alguém com tanto "mundo", tão vivido como tu, não perceba que não há nada de racional nesses meus comentários, mas tão somente uma brincadeira e uma provocação.
Agora se me estás a dizer que as imagens que coloquei no post original, que pertencem a uma cena quase poética de tão sensual que é, do Mulholland Drive, (o que não tenho dúvidas que imediatamente identificaste), te provocam a mesmíssima reacção, e atenção que falo de sensações espontanêas e não de racionalizações, que por exemplo as cenas de um Brokeback Mountain, então digo-te que é natural que não compreendas "os arrepios e naúseas", termos obviamente referentes a um contexto tão exageradamente homofóbico, que volto a insistir, me parece evidente não ser para tomar à força da letra, mas sim claramente irónico.

Ponto 4- falas da tua perplexidade perante os "frequentes desabafos e piadas sobre os "paneleiros, e os rabos, e os ..." e acrescentas que "parece-me uma fobia reveladora de um certo atavismo social/cultural". Concordo a 100%. Muitas vezes reproduzimos terminologia que mesmo a brincar vai alimentando alguns preconceitos latentes na sociedade.
Rabetas, fufas, pretos, ciganos, monhés, chinocas, entre outros são exemplos destes maus hábitos de linguajar. Estou certo que tu não os usas, nem a sério nem em tom jocoso. Eu, mesmo tendo plena consciência do erro, confesso que às vezes fraquejo. Tentarei no futuro falar só de senhores ou senhoras com preferência romântica/sexual por pessoas do mesmo sexo (posso só dizer homossexuais, ou também achas que já tem uma carga pejorativa?), indíviduos de etnia africana, ou pertencentes à raça cigana, ou de origem indiana, ou de ascendência chinesa.
Não terás porventura à mão um comprimido que me transforme, tipo abracadabra, num homo sapiens 100% politicamente correcto?

Ponto 5- como a "redenção das leviandades" que escrevi já vai longa, passo agora ao tema que não abordei mas que tu, tão suavemente introduziste na discussão: "a possibilidade de casais gays adoptarem crianças". Para evitar causar-te dúvidas, aviso desde já que estou a falar o mais seriamente que me é possível.
Tu és 100% contra. Eu sou a favor. Não atribuo aqui percentagens porque de facto o assunto é delicado e vejo muitas áreas cinzentas e poucas a preto e branco. Achas que um casal por ser gay vai interferir com a liberdade de uma criança que crie? Não compreendo. Achas que a criança vai ser induzida, mesmo que inconscientemente e involutariamente, a ser também ela gay? E a ser verdade, isso também não acontecerá numa criança criada por um casal hetero? Não terá ela tendência para ser hetero? O facto de achares que um casal hetero garante a liberdade e os direitos da criança e que um casal gay não o pode fazer, constitui, desculpa que te diga, um juízo de valor sobre a normalidade de ser heterossexual versus a anormalidade de ser homossexual.
E já agora, que achas de adopção por pais ou mães solteiros? Achas que só casais devem poder adoptar? Achas que uma criança fica melhor entregue à guarda de uma qualquer instituição privada ou estatal e que alguém, só por ser solteiro, não poderá proporcionar um lar feliz e um ambiente saudável?

Sabes, caro JB, é que se a tua resposta for como a minha (que não vejo razão para uma pessoa solteira não poder, só por esse facto, adoptar), posso então admitir, no seguimento do teu raciocínio sobre os casais gays, que se o/a pessoa solteira for homossexual, então não deve poder adoptar?

A tua opinião sobre este tema "parece-me uma fobia reveladora de um certo atavismo social/cultural, mas quem sabe se sou eu que estou enganado...".

Eu não acho que a sexualidade deva gerar descriminação. Nem no casamento. Nem na adopção. Para todos os tipos de casais. Ou pessoas solteiras. Ponto. A sério. Sem ironias nem cinismos.

P.S.- agradeço a "hipótese" que me deste para me "defender".
Espero que te seja perceptível o que é dito a sério e o que é provocação.
Um abraço enorme.

2 comentários:

Anónimo disse...

bom, wolverine, nem escreves mal. Mas talvez não seja errado dedicares-te a desenvolver uma ironia mais "irónica"...Agora fica a dúvida entre a opinião verdadeira e a "irónica"

wolverine disse...

a ironia, para ter alguma piada,não deve ser demasiado óbvia mas sim "fina", quase sugerida, digamos que a meias entre o conteúdo do que está escrito e a interpretação de quem lê.
em relação à "opinião verdadeira" sobre os temas em discussão, acho que está clara e inclusivamente assinalada como tal em algumas partes do texto.

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